400 anos do Carisma Vicentino: uma história a ser celebrada
Como Família Vicentina, celebramos em 2017 os 400 anos de nosso carisma fundacional. Ele é para nós um dom e um compromisso, o modo como Deus nos convida a participar ativa e criativamente de Sua obra. Este carisma (charisma = graça) não é fruto de esforços meritórios de nossos Fundadores, tampouco nosso, mas é puramente graça divina, expressão da ação vivificante do Espírito na história que, em sua multiplicidade e gratuidade de dons, os distribui entre nós para o bem de todos/as (cf. 1 Cor 12, 11). Assim sendo, ao fazermos memória da trajetória do carisma ao longo dos séculos, não estamos a comemorar uma realidade estática e acabada, à qual nada mais pode ser acrescido, nem uma proposta que chegou a seu termo. Ao contrário, este ano jubilar nos dá a oportunidade de revisitar nossas origens, contemplar a vida e a obra daqueles/as que nos precederam, suas experiências de fé, suas percepções da vida e do mundo, e, em continuidade com essas intuições originárias, nos descobrir partícipes de um projeto que está em plena construção.
Os acontecimentos a serem rememorados neste ano estão ligados, sobretudo, a nosso fundador São Vicente de Paulo (1581-1660), tendo em vista a singularidade que o ano de 1617 representou para sua vida e missão. Contudo, no entendimento de que o carisma não é um projeto pronto, nem uma obra individual, somos convidados/aas a celebrar os 400 anos na interface com outras pessoas e experiências que o foram dimensionando e enriquecendo ao longo da história. Para as Filhas da Caridade e colaboradores/as de suas frentes de ação, isso implica, necessariamente, em envolver nesta comemoração a pessoa e o pensamento de Luísa de Marillac, que deu uma contribuição importantíssima para as iniciativas de Vicente de Paulo.
Conforme expresso na identidade visual dos 400 anos, dois fatos acontecidos no ano de 1617 são particularmente rememorados neste jubileu. Eles estão representados pelo nome das duas cidades francesas presentes na logo: Gannes-Folleville e Châtillon Les Dombes.
A pequena cidade de Folleville nos recorda o chamado “Sermão da Missão” proferido por São Vicente em 25 de janeiro de 1617. Sensibilizado ao atender em confissão um ancião da comunidade, tido por ela como um homem de bem, mas que vivia uma situação espiritual dramática, ao escutá-lo e lhe ministrar o sacramento da penitência, Vicente ajuda este pobre homem a viver uma profunda experiência de reconciliação. Ao mesmo tempo, o acontecimento provoca em nosso Fundador a percepção da situação de abandono e vulnerabilidade espiritual do povo, especialmente daqueles que viviam no campo. Instigado pela Madame de Gondi, para cuja família contribuía na educação dos filhos e no atendimento das comunidades cristãs existentes nas terras desta, Pe. Vicente exorta os/as cristãos/ãs de Folleville à confissão geral, a fim de que todos/as pudessem fazer esta mesma experiência de perdão e reconciliação. A adesão daquela comunidade foi tão significativa que necessitou da cooperação de outros padres e se espalhou para outras regiões próximas, revelando-se, assim, um acontecimento missionário notável. O dia 25 de janeiro, que na liturgia católica marca a festa da conversão de São Paulo, marca também o início da Congregação da Missão, uma das três fundações em vida de Vicente de Paulo. Essa fundação que, estruturalmente, se inicia em 1625, tem no Sermão de Folleville a síntese de sua vocação missionária expressa em seu lema: Evangelizare pauperibus misit me, interpretado em relação à mensagem bíblica de Lc 4, 16ss: "Ele me enviou para evangelizar os pobres".
No mesmo ano de 1617, em 20 de agosto, um novo acontecimento marca a vida e o ministério de Pe. Vicente, período em que atua como pároco na cidade de Châtillon Les Dombes. Ao se preparar para presidir a missa, ele é informado por uma mulher da comunidade sobre uma família inteira que estava doente, passando necessidades, de modo que seus membros estavam impossibilitados de cuidar uns dos outros. Compadecendo-se dessa situação, nosso Fundador aproveita o momento da pregação para comunicar esse caso aos/às seus/suas paroquianos/as e exorta-os/as a fazer algo em prol da família. A resposta dada por eles surpreende o surpreende. As senhoras da comunidade se reuniram, organizaram provisões e as levaram até a família. No mesmo dia Vicente vai à casa dos enfermos atendidos para visitá-los, e se depara com um grande número de mulheres que iam e vinham, bem como tantas outras que estavam junto à família. Sua constatação é clara: “eis aí uma grande Caridade, porém, desorganizada”. Desta experiência surgem, posteriormente, as Confrarias da Caridade, formada por senhoras que dispunham de seu tempo e recursos para atender os pobres. Está é a primeira fundação de Vicente de Paulo, hoje conhecida internacionalmente como Associação Internacional de Caridades (AIC). Uma das primeiras contribuições de Luísa de Marillac nas iniciativas de São Vicente foi a animação e formação das referidas Confrarias.
Mais do que uma recordação histórica, essa celebração quadricentenária nos mostra que os lugares que nós percorremos hoje, inspirados/as na vida e obra de Vicente e Luísa, também são espaços da presença e manifestação de Deus, onde Ele nos fala e nós Lhe respondemos com nossa caridade ativa e criativa. Por isso, como Família Vicentina, constituída por mais de trezentas congregações, associações e grupos que bebem das intuições desse carisma, celebramos festivamente a história, o presente e o futuro de nossa missão.
EXPLICAÇÃO DA LOGO DOS 400 ANOS:
A logo oficial, elaborada pelo Pe. Alexis Cerquera Trujilo, nos ajuda a aprofundar o sentido desta celebração:
- O círculo, formado por diversas linhas e cores, de formato radiante, representa o mundo, a história, a vida;
- As linhas ou raios do círculo simbolizam os organismos membros da Família Vicentina, bem como a sociedade, com suas imperfeições e alegrias, esperanças e cansaços;
- As estrelas enlaçadas pelo círculo recordam os dois “lugares teológicos” - Gannes-Folleville e Châtillon-les-Dombes – e as experiências paradigmáticas vividas por Vicente neles; a localização destas estrelas também remete ao território francês;
- A cruz de luz formada a partir da união das estrelas recorda a Ressurreição e Pentecostes, eventos dos quais nasce a Igreja. A cruz recorda igualmente a presença do Espírito Santo que nos habita e convida a viver e agir no mundo como Família Vicentina, motivo pelo qual o rosto de São Vicente está localizado na intersecção da cruz.
Confira a mensagem do Superior Geral da Família Vicentina, Pe. Tomaz Mavric, no início do 400º aniversário do Carisma Vicentino: